Prisão de Spandau (Alemanha): quando se trituram os monumentos do passado para controlar o presente

A questão da manutenção ou não de espaços históricos é complexa. Decidir conservar ou demolir é uma decisão muitas vezes necessária, mas difícil. Afinal, as estruturas físicas antigas guardam registros importantes sobre a história humana. No entanto, em outros casos a destruição de um monumento (compreendendo aqui que uma construção histórica é em si mesma um documento e um monumento) é compreensível e até apoiável.

Talvez esse seja o caso da prisão de Spandau, na Alemanha.


Spandau em troca de guardas no ano de 1986, americanos à esquerda e britânicos à direita. Autor: Bauamt Süd, Einofski. Fonte: commons.wikimedia.org


Fundada em 1876, no bairro de Spandau (Berlim), em seus primeiros dias serviu como ambiente de detenção militar para o Exército Prussiano. No século XX, ainda na primeira década, foi convertida em uma prisão que também detinha condenados civis. Com a ascensão de Hitler ao poder, em 1933, Spandau se tornou cenário de custódia dos presos políticos do Nazismo. É reconhecido que a prisão foi transformada em um proto-campo de concentração, com presença da Gestapo e suas práticas de tortura. No final de 1933, com a abertura de campos de concentração (como ficaram posteriormente conhecidos), os prisioneiros em Spandau foram transferidos.

No período pós-guerra, com a derrota dos nazistas pelos Aliados, a prisão foi o local onde alguns dos condenados alemães foram mantidos. O último detento foi Rudolf Hess, vice de Adolf Hitler, sentenciado à prisão perpétua.

Hess passou por muitos estudos, especialmente de psiquiatras, durante seu período de prisão em Spandau. Tanto por médicos britânicos quanto soviéticos. Apesar das vistorias constantes, que tentavam evitar esse fim, o nazista cometeu suicídio.

Depois da morte desse último prisioneiro, em 1987, foi decidido pela gestão das nações vencedoras que o local deveria ser completamente demolido. Estados Unidos, França, União Soviética e Reino Unido decretaram a destruição total de Spandau.

A preocupação era que a prisão fosse transformada em um monumento de grupos neonazistas. O que poderia resultar em um palco de culto e peregrinação. O processo de destruição de todas as estruturas foi acompanhado de guardas armados. Esses receberam a autorização de disparar letalmente contra qualquer um que fosse pego tentando guardar algum pedaço dos destroços como souvenir. 

Essa situação evidencia o temor dos Aliados, ao perceberem a existência daquele espaço - que não deixava de ser em si mesmo um monumento histórico que remontava ao século XIX - como um problema frente aos horizontes de expectativa do pós-guerra.

Depois de tudo ter sido derrubado, os escombros foram literalmente transformados em pó. Após a pulverização, os resíduos foram levados até uma base britânica não informada, na região do Mar do Norte. Impossibilitando qualquer reutilização simbólica - mesmo da poeira - do que antes era a prisão de Spandau.

Os Aliados não permitiram que a prisão continuasse e fosse elevada ao status de monumento de resistência por grupos neonazistas. Diferente do que aconteceu com outros locais, que foram extremamente ressignificados - com fins educacionais e em memória das vítimas -, o destino definido para Spandau foi distinto. Enquanto outras estruturas passaram a ser palco de reflexão histórica sobre os crimes do Nacional Socialismo Alemão, e de lembrança daqueles que foram vitimados, Spandau não existe mais. Por decisão consciente dos Aliados, para evitar danos no presente, o monumento foi pulverizado.

O caso de Spandau revela as complexidades envolvidas com a permanência ou superação de estruturas arquitetônicas históricas. O histórico da prisão no século XIX, que poderia ser um argumento para sua proteção, foi superado pelo terror daquilo que poderia simbolizar no pós-guerra, depois de sua história sob o nazismo. Teria sido possível manter Spandau, direcionando a prisão para uma ótica de memória dos absurdos do Nacional Socialismo? Ou a destruição foi realmente a melhor opção? 


Referências:

FISHMAN, Jack. Long Knives and Short Memories: The Spandau Prison Story. New York: Richardson & Steirman, 1987.

THOMPSON, Nathan; HART, Amber. From Spandau to Guantanamo. Perspectives on Terrorism, v. 15, n. 4, p. 141-154, 2021.


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