CRÍTICA - Palco Virtual do Itaú Cultural - Espetáculo Contrações (2020)

Yara de Novaes como "Gerente" em uma apresentação física do espetáculo (imagem Guto Muniz. Fonte: www.itaucultural.org.br)

 - Você sangra?

Não, essa fala não foi retirada de "Batman vs Superman". Faz parte do texto do Espetáculo "Contrações"(classificação indicativa de 14 anos) que esteve em exibição nos dias 6, 13 e 20 de outubro de 2020 de forma virtual. Contrações é apresentada em teatro físico há mais de cinco anos pelo Grupo 3 de Teatro e agora, por conta da pandemia,  contou com essas apresentações no Palco Virtual do Itaú Cultural. O texto é do inglês Mike Bartlett (Barlett escreveu primeiramente uma peça para o rádio chamada Love Contract, depois adaptou para o seu texto Contractions) e conta com tradução de Silvia Gomes. A Direção é por conta de Grace Passô e no elenco estão Yara de Novaes e Débora Falabella. Tudo se passa no escritório de uma multinacional e começa quando a Gerente (Yara Novaes) convoca a funcionária Emma (Débora Falabella) para ler em sua frente, em voz alta, um trecho de seu contrato. O trecho diz respeito a proibição da relação "romântica ou sexual" entre os funcionários. A partir disso a peça vai do plausível em nossa realidade até um realismo fantasioso - em alguns momentos em um estilo nonsense.

Ao assistirmos a peça apresentada de forma virtual é de se notar que no teatro físico sua apresentação seria absolutamente diferente. Caso fosse necessário optar por apenas uma modalidade, físico ou digital, não sei qual seria melhor. Nunca assisti o espetáculo em teatro físico, mas de forma digital com certeza é tão bom quanto ou - ouso dizer - melhor. 

No site do Grupo 3 a peça é definida como "uma obra cruelmente engraçada, que parte de uma situação totalmente plausível na realidade para demonstrar sua faceta mais absurda". Discordo da primeira afirmação, mas endosso a segunda. Pelo que pesquisei na internet sobre o espetáculo, os trechos de apresentações em teatro que estão disponíveis, o físico e o digital mudaram muito o tom da obra. Em alguns momentos a platéia ria no teatro, mas nesses mesmos momentos enquanto eu estava sentado no sofá da sala assistindo os mesmos trechos me causaram reflexão e não risos. Evidente que não sei se com todos que assistiram de forma digital ocorreu o mesmo. No entanto, posso afirmar que o tom muda muito. Creio que seja difícil ver as partes que no teatro soam cômicas da mesma forma na apresentação digital. Fiquei surpreso quando vi o primeiro vídeo da plateia rindo. Não vejo isso como ruim, pelo contrário, vejo como muito bom - talvez melhor.

Imagem da tela em um dos momentos do espetáculo digital.

A Direção com certeza é o ponto mais alto do espetáculo. As atrizes estão muito boas, mas a Direção é motivo de aplausos em todos os momentos. A montagem digital da peça foi simplesmente magnífica. Em uma estrutura de várias câmeras, contando com diferentes  quadros aparecendo simultaneamente na tela, além de imagens de fundo que expressam o clima "espiritual" das personagens e do desenrolar da história. A trilha sonora, que ao que me parece é mais presente no espetáculo físico, é bem pontual no digital. Destaco o muito bem encaixado Requiem de Mozart no Ato final. Comento novamente sobre os quadros simultâneos, talvez essa estratégia tenha gerado uma seriedade que me impediu de sentir os momentos cômicos como deveriam. Mudaram o tom, mas para o meu gosto foi uma escolha memorável da Diretora e que me fez admirar mais a peça.

Alguns problemas "técnicos" ocorreram, por conta de as atrizes estarem controlando as câmeras, mas mesmo isso pareceu natural e programado para ocorrer - exceto em uma situação no dia em que assisti, dia 13 (assisti o final também no dia 20). As atrizes conduziram bem as personagens, mas visivelmente diferente do físico. O desafio deve ter sido grande para essa nova forma de atuar em uma peça.

O desafio para a produção de tudo também deve ter exigido muito esforço e criatividade, mas em compensação produziu uma obra que inspira uma nova forma de fazer teatro em tempos de pandemia.

Uma experiência boa. Um bom espetáculo.


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