O eleitorado brasileiro é o Paradoxo de Giddens?: As problemáticas ambientais não existem mais até estarem diante dos olhos



Na década de 1990 o Brasil foi palco para as discussões globais que tratavam a questão da problemática ambiental. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (conhecida como ECO-92 ou Rio 92), realizada em 1992 no Rio de Janeiro, dava continuidade aos debates oficiais de grandes proporções, iniciados em 1972 em Estocolmo, sobre os problemas ambientais. A conferência reuniu representantes de mais de 150 países e pretendeu discutir e construir soluções, em níveis globais, que diminuíssem os danos humanos ao meio ambiente e garantissem a boa existência de gerações futuras. 

Já em 1997 uma pesquisa é realizada pelo IBOPE visando entender as compreensões da população brasileira sobre o meio ambiente. Uma equipe de cem pesquisadores visitaram casas em todo o país questionando homens e mulheres, jovens e idosos, durante dois meses. Os resultados da pesquisa foram apresentados na Teleconferência Nacional de Educação Ambiental, promovida pelo MEC em Junho de 1997. 

Os resultados daquela pesquisa mostraram naquele momento grande preocupação dos brasileiros sobre os problemas ambientais. Cerca de 65% dos entrevistados dizia que a poluição não era aceitável como preço pela garantia de empregos. Esse resultado foi surpreendente na época e com certeza ainda é surpreendente ao olharmos de 2018. O ano de 1997 para o Brasil não foi de melhor situação no setor econômico, mas mesmo assim a pesquisa mostrou que 47% dos brasileiros entrevistados acreditava que o meio ambiente deveria ser prioridade sobre o crescimento econômico.

Uma pesquisa mais recente, realizada pelo Pew Research Center (Washington-DC), de 2015 buscou descobrir quais os maiores medos da humanidade. No geral os medos que ocupavam os primeiros lugares eram o Estado Islâmico (1º lugar) e as mudanças climáticas (2º lugar). Se olhando para a America Latina o medo que aparecia em primeiro lugar eram as mudanças climáticas.

Considerando os resultados da pesquisa de 1997 realizada pelo IBOPE e a pesquisa de 2015 realizada pelo Pew Research Center me pergunto quais resultados seriam obtidos hoje - 2018 - se o IBOPE questionasse novamente a população sobre as questões ambientais.

Para alguém que visita a internet em sites como Facebook, Youtube, Twitter, etc, reconhece que algo um pouco estranho - ou não - está cada vez mais frequente nos comentários de internautas: O aquecimento global não existe, a humanidade não provoca efeito negativo significativo nenhum no planeta, os ambientalistas 'esquerdistas' querem criar impostos para você respirar.

Os resultados da eleição de primeiro turno para à presidência do Brasil em 2018 talvez mostre que o eleitorado brasileiro talvez esteja sofrendo cronicamente com o "Paradoxo de Giddens". O candidato que chegou ao segundo turno em primeiro lugar acredita que o aquecimento global é uma grande conspiração e, se eleito, visa seguir os caminhos de Donald Trump e retirar o Brasil do acordo de Paris.

O grande número de votos no candidato demonstram a diminuição da preocupação com as problemáticas ambientais, e pior, talvez a descrença na existência dessas problemáticas. 

O Paradoxo de Giddens é uma denominação elaborada pelo sociólogo britânico Anthony Giddens. O paradoxo diz que não importa quanto nos falem das ameaças do aquecimento global, todos os avisos e o perigo parecem ser algo irreal. Por conta de os perigos representados pelo aquecimento global não serem palpáveis e visíveis aos olhos ninguém tenta fazer nada. Se as atitudes forem tomadas apenas quando o problema for visível será tarde demais. 

Aí está o paradoxo. Se todos se inspirarem em São Tomé e só acreditarem vendo, talvez quando pudermos ver com os próprios olhos seja tarde demais.

A população brasileira, que em outros momentos se mostrou preocupada com as problemáticas ambientais e a mudança climática, hoje parece desacreditar no discurso sobre os problemas. Até mesmo chegando a acreditar em uma grande conspiração.

O filósofo conservador Roger Scruton em seu livro "Filosofia Verde: como pensar seriamente o planeta" comenta que os discursos em tom apocalíptico de muitos ambientalistas colabora para a descrença nas problemáticas. Afinal, se prometem o fim do mundo e o fim do mundo não chega o discurso passa a ser desconsiderado.

Em uma rápida leitura talvez alguém que leia o livro de Scruton imagine que deve ficar totalmente tranquilo perante as problemáticas ambientais. No entanto, Scruton só apresenta outra forma de lidar com essa questão. Anthony Giddens segue para um lado que visa uma grande intervenção por parte do Estado e Scruton acredita que a visão conservadora pode ajudar a solucionar o problema; cada um deve enxergar o planeta como sua casa, cada um deve fazer sua parte.

Anthony Giddens e Roger Scruton possuem soluções diferentes para a problemática, no entanto, reconhecem que é importante tentar achar soluções e agir. E talvez o mais importante de se enfatizar: acreditam que o problema existe.

O eleitorado brasileiro já há algum tempo consome materiais pelas mídias digitais que pretendem classificar como falso o aquecimento global e defender como insignificante a ação humana no planeta. O maior argumento é "Quando você viu o aquecimento global?". 

Isso é bastante sério em medida que o que está em jogo não é o quanto o aquecimento global é um problema (Scruton, por exemplo, discorda de ambientalistas quanto ao grau da problemática, mas não da existência dela), mas se o aquecimento global é realmente um problema, já que não está visível aos olhos.

Não queria expor tão explicitamente no entanto é um exemplo "material" do Paradoxo de Giddens no eleitorado brasileiro. Abaixo é um print screen de um vídeo presente na Plataforma do Youtube onde Eduardo Bolsonaro, deputado federal que em 2018 se tornou o mais votado da história, comenta sobre a "farsa do aquecimento global". Seu argumento principal é que está em um lugar nos Estados Unidos onde nevou. A partir disso conclui a farsa do aquecimento global.




Talvez se a pesquisa do IBOPE fosse realizada em 2018 a maioria dos entrevistados afirmasse que os problemas ambientais não existem. Na pesquisa de 1997, 95% dos entrevistados disseram que a Educação Ambiental deveria ser obrigatória nas escolas. Talvez daqui há alguns dias os brasileiros estejam defendendo que a Educação Ambiental é doutrinação, e deve ser retirada de todos os níveis de ensino. Pelo menos, até observarem com seus próprios olhos a neve derreter.

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